Jequitibá-Rosa
Cariniana legalis
Imponente gigante da Mata Atlântica, o jequitibá-rosa ostenta altura de até 50 metros e troncos colossais de até 7 metros de diâmetro. Sua copa frondosa, adornada por folhas coriáceas e flores delicadas, oferece refúgio verdejante para a vida local.
Monumento à longevidade, estima-se que alguns indivíduos ultrapassem 1.000 anos, testemunhos silenciosos das transformações do tempo. Mais do que grandiosidade física, o jequitibá-rosa se destaca pela força da vida, inspirando admiração e respeito.
Berçário de vida, suas flores atraem polinizadores, garantindo a reprodução de diversas plantas. Seus frutos alimentam animais, desde pequenos roedores até grandes mamíferos. Guardião da floresta, sua copa fornece sombra e abrigo, raízes profundas estabilizam o solo e impedem a erosão. Purifica o ar, absorvendo dióxido de carbono e liberando oxigênio vital.
Patrimônio natural ameaçado pela devastação da Mata Atlântica, perda de habitat e exploração madeireira, sua preservação é crucial para a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos que oferece.
Unir esforços para preservar essa espécie magnífica é garantir que as futuras gerações possam apreciar sua beleza e importância para o planeta.
Taxonomia e Nomenclatura
De acordo com o Sistema de Classificação de Cronquist, a taxonomia de Cariniana legalis obedece à seguinte hierarquia:
Divisão: Magnoliophyta (Angiospermae)
Classe: Magnoliopsida (Dicotiledonae)
Ordem: Lecythidales
Família: Lecythidaceae
Espécie: Cariniana legalis (Martius) O. Kuntze, Kuntze, Rev. Gen, 3(2): 89, 1898.
Sinonímia botânica: Cariniana brasiliensis, Casar.; Couratari legalis Martius
Nomes vulgares: caixão, em Minas Gerais e no Estado do Rio de Janeiro; coatinga, em Minas Gerais; congolo-de-porco; cravinho-branco, no Espírito Santo; estopa; jequitibá, em Alagoas, na Bahia, no Espírito Santo, em Minas Gerais, nos Estados do Rio de Janeiro e de São Paulo; jequitibá-de-agulheiro; jequitibá-branco, na Bahia, em Minas Gerais e no Estado do Rio de Janeiro; jequitibá-cedro; jequitibá-grande; jequitibá-rei; jequitibá-vermelho, na Bahia, em Minas Gerais, nos Estados do Rio de Janeiro e de São Paulo; pau-caixão; pau-carga, em Alagoas e em Pernambuco; pau-de-carga e sapucaia-de-apito, em Pernambuco; pau-de-cerne, em Alagoas; e sapucaia-de-assovio.
Etimologia: Cariniana é uma homenagem ao príncipe Eugene de Savóia – Carignan, que subsidiou a viagem de Giovanni Casaretto ao Brasil, em1839 e 1840; legalis vem do latim legalis (legal), por ser madeira de lei, isto é, madeira especial para construção civil e naval, que o governo português reservava para a Coroa, podendo ser comercializada e exportada somente pelo governo da Metrópole (Reitz, 1981).
Descrição
Forma biológica: árvore semicaducifólia, com 10 a 25 m de altura e 60 a 100 cm de DAP, podendo atingir excepcionalmente 60 m de altura e 400 cm de DAP, na idade adulta. É uma das maiores árvores da Região Sudeste.
Tronco: reto, cilíndrico e colunar. Fuste com até 20 m de altura ou mais.
Ramificação: racemosa. Copa ampla e globosa, em forma de guarda-chuva. Folhagem densa e brilhante, com ramos horizontais, suporta muitas orquídeas e bromélias. As folhas novas são avermelhadas.
Casca: com espessura de até 50 mm. A casca externa é marrom-escura a parda, rugosa, rígida, profundamente sulcada. A casca interna é avermelhada.
Folhas: alternas, ovado-oblongas a elípticas, crenadas, dentadas, com 4 a 8 cm de comprimento por 1,7 a 4 cm de largura.
Flores: amarelo-pálidas a creme, com 5 a 6 mm de comprimento, em pequenos racemos de 2 a 6 cm, reunidas em panícula terminal densa, de até 18 cm de comprimento.
Fruto: pixídio capsular alongado e lenhoso, com 4,5 a 7 cm de comprimento e 1,5 a 3 cm de diâmetro, encimado por opérculo (tampa) com abertura íntegra (Beltrati et al., 1982). Em cada fruto encontram-se de 10 a 15 sementes.
Sementes: aladas com núcleo seminal basal, com até 30 mm de comprimento.
Biologia Reprodutiva e Fenologia
Sistema sexual: planta monóica (Sebbenn et al., 2000).
Vetor de polinização: provavelmente as abelhas (Morellato, 1991).
Floração: de outubro a novembro, em Minas Gerais; de dezembro a março, no Estado de São Paulo; de janeiro a março, em Pernambuco, e de abril a maio, no Estado do Rio de Janeiro.
Frutificação: os frutos amadurecem de maio a outubro, no Estado de São Paulo; de julho a agosto, em Minas Gerais; de julho a setembro, no Espírito Santo, e de dezembro a fevereiro, em Pernambuco. O processo reprodutivo inicia ao redor dos 20 anos de idade, em plantios.
Dispersão de frutos e sementes: autocórica, principalmente barocórica, por gravidade e anemocórica, pelo vento.
Ocorrência Natural
Latitude: 7º S na Paraíba a 23º S no Estado de São Paulo.
Variação altitudinal: de 30 m, no litoral das Regiões Sudeste e Nordeste a 1.000 m de altitude, no Estado de São Paulo e em Minas Gerais.
Distribuição geográfica: Cariniana legalis é encontrada de forma natural no Brasil, nos seguintes Estados (Mapa 70):
• Alagoas (Tavares et al., 1967; Prance & Mori, 1979).
• Bahia (Soares & Ascoly, 1970; Mello, 1973; Leão & Vinha, 1975; Mori & Prance, 1983; Fernandes & Vinha, 1984; Pinto et al., 1990; Oliveira et al., 2000).
• Espírito Santo (Ruschi, 1950; Jesus, 1988; Lopes et al., 2000; Thomaz et al., 2000).
• Minas Gerais (Heringer, 1947; Azevedo, 1962; Brandão et al., 1989; Campos & Landgraf, 1990; Vieira, 1990; Gavilanes & Brandão, 1991; Carvalho et al., 1995; Gavilanes et al., 1995; Coraiola, 1999; Leoni, 2000).
• Paraíba (Pontes & Barbosa, 1998).
• Pernambuco (Lima, 1954; Tavares, 1959; Lima, 1970).
• Estado do Rio de Janeiro (Guimarães et al., 1988; Silva Neto et al., 1999).
• Estado de São Paulo (Kuhlmann & Kuhlmann, 1947; Nogueira et al., 1982; Kageyama, 1986; Demattê et al., 1987; Pagano et al., 1987; Matthes et al., 1988; Vieira et al., 1989; Toledo et al., 1993; Nóbrega et al., 2000).
Locais identificados de ocorrência natural de jequitibá-rosa (Cariniana legalis), no Brasil.
Aspectos Ecológicos
Grupo sucessional: espécie com característica de secundária tardia (secundária longeva), mas não clímax (Harrit & Jesus, 1987; Durigan & Nogueira, 1990).
Características sociológicas: o jequitibá-rosa não ocorre em pastagens, pois é árvore essencialmente da floresta, onde ocorre nas baixadas e encostas úmidas, sendo encontrada em pequenos grupos. É árvore longeva, podendo ultrapassar os 500 anos de idade.
Medições com carbono 14 registram indivíduos com até 3 mil anos, em várias partes do Brasil (Jequitibá, 1989). Há um jequitibá localizado no Km 230 da Via Anhangüera, no Estado de São Paulo, com idade, registrada numa placa, de 4.500 anos (Árvores …, 1992). Entretanto, idades próximas ou acima de 3 mil anos devem ser vistas com reservas.
Regiões fitoecológicas: Cariniana legalis é encontrada no estrato superior da Floresta Ombrófila Densa (Floresta Atlântica), na formação Baixo-Montana (Guimarães et al., 1988) e na Submontana (Oliveira et al., 2000, na Floresta de Tabuleiro, no norte do Espírito Santo (Peixoto et al., 1995; Rizzini et al., 1997) e na Floresta Estacional Semidecidual.
Densidade: nas florestas localizadas no sul da Bahia e no norte do Espírito Santo, o volume de madeira do jequitibá-rosa era de 4,10 m3.ha-1, sendo encontradas 0,6 (Rizzini, 1971) a 0,8 árvores por hectare (Harritt & Jesus, 1987). Numa área da Floresta Estacional Semidecidual no Estado de São Paulo, foram encontradas 11 árvores por hectare (Vieira et al., 1989).
Clima
Precipitação pluvial média anual: desde 1.100 mm no Estado do Rio de Janeiro a 2.500 mm em Pernambuco.
Regime de precipitações: chuvas uniformemente distribuídas, no Estado do Rio de Janeiro e no sul da Bahia, e periódicas, com chuvas concentradas no verão, nas demais regiões.
Deficiência hídrica: nula, no Estado do Rio de Janeiro e no sul da Bahia, e moderada com estação seca de até 4 meses no norte do Espírito Santo, e no Nordeste.
Temperatura média anual: 19,4ºC (Lavras, MG / Viçosa, MG) a 26,1ºC (João Pessoa, PB).
Temperatura média do mês mais frio: 15,4ºC (Viçosa,.MG) a 23,9ºC (Recife, PE).
Temperatura média do mês mais quente: 21,1ºC (Porto Seguro, BA) a 28,2ºC (João Pessoa, PB).
Temperatura mínima absoluta: -1,8ºC (Rio Claro, SP).
Número de geadas por ano: médio de 0 a 2; máximo absoluto de 5 geadas, na Região Sudeste, mas predominantemente sem geadas ou pouco freqüentes.
Tipos climáticos (Koeppen): tropical (Af, Am e Aw) e subtropical de altitude (Cwa e Cwb).
Solos
O jequitibá-rosa ocorre naturalmente em solos de origem arenítica e basáltica. É encontrado em espigões, encostas, em solos rasos, como em Litossolos, no Estado de São Paulo (Nogueira, 1977), mas também em solos úmidos e profundos, de boa fertilidade química e bem drenados. Em plantios, no entanto, prefere solos com propriedades físicas adequadas, como de média a boa fertilidade química, bem drenado e com textura que varia de franca a argilosa.
Sementes
Colheita e beneficiamento: o fruto deve ser coletado quando muda de coloração e quando se apresentarem em início de abertura dos opérculos, aparecendo as primeiras sementes. Após a coleta, são deixados em ambiente ventilado para a abertura. Batendo-se nos frutos, as sementes são extraídas com facilidade. Recomenda-se retirar a asa da semente por ocasião da semeadura.
Número de sementes por quilo: 22.470 (Lorenzi, 1992) a 32.000 (Gurgel Filho & Pásztor, 1962).
Tratamento para superação da dormência: não apresenta dormência.
Longevidade e armazenamento: as sementes mantêm a viabilidade por até 12 meses, em câmara seca (22ºC e 40% de UR) ou câmara fria (5ºC e 95% de UR).
Germinação em laboratório: o substrato solo, temperatura de 30ºC e luz contínua podem ser utilizados nos estudos de germinação dessa espécie (Rêgo & Possamai, 1999).
Produção de Mudas
Semeadura: recomenda-se semear em sementei- ras, para posterior repicagem, ou duas sementes em sacos de polietileno com dimensões mínimas de 20 cm de altura e 7 cm de diâmetro, ou em tubetes de polipropileno grande. A repicagem deve ser efetuada 2 a 4 semanas após a germinação.
Germinação: epígea, dando-se entre 8 a 45 dias após a semeadura, geralmente entre 28% e 70%. O tempo mínimo em viveiro é de 6 meses.
Cuidados especiais: recomenda-se poda radicial e poda aérea nas mudas passadas, antes do plantio, e empregar, no viveiro, condição de meia sombra, usando-se como cobertura do canteiro, sombrite com 50% de intensidade (Trape & Oliveira, 1994/1995).
Propagação vegetativa: estacas caulinares, com até 78% de enraizamento, utilizando-se principalmente o AIB (ácido indol butírico). A formação do calo dá-se 3 semanas após o estaqueamento, e o enraizamento 6 semanas após essa operação. O tratamento-controle apresentou 31,25% de pegamento, mostrando a capacidade de enraizamento da espécie (Harritt & Jesus, 1988).
Características Silviculturais
O jequitibá-rosa é uma espécie semi-heliófila, que tolera sombreamento durante os primeiros anos; não é tolerante a baixas temperaturas quando jovem.
Hábito: apresenta crescimento monopodial com galhos finos e boa forma de fuste, independentemente de espaçamento. Apresenta boa desrama natural, com galhos finos e boa cicatrização.
Métodos de regeneração: o jequitibá-rosa pode ser plantado a pleno sol, em plantio puro ou em plantio misto, observando-se nos plantios desuniformidade de crescimento entre os exemplares, e em vegetação matricial arbórea, em faixas abertas em vegetação secundária e plantio em linhas. Brota da touça após corte, podendo ser manejado por talhadia.
Melhoramento e Conservação de Recursos Genéticos
Cariniana legalis é uma espécie em vias de extinção, categoria vulnerável (Vieira, 1990), apresentando um reduzido número de exemplares em ocorrência natural (Siqueira et al., 1986; Itoman et al., 1992). Várias instituições têm se preocupado com sua conservação (Vieira, 1990; Siqueira & Nogueira, 1992) e melhoramento genético (Siqueira et al., 1986b).
Em Linhares, ES, Jesus et al. (1992) observaram grande variação em altura e DAP nos plantios, indicando boas possibilidades de ganhos com melhoramento genético. Testes efetuados no Estado de São Paulo evidenciaram variabilidade genética entre procedências e progênies dessa espécie (Nogueira et al., 1982; Siqueira et al., 1986).
Resultados mais recentes revelaram interações do tipo populações versus locais e progênies versus populações, indicando que a seleção para o melhoramento da espécie deva ser praticada em nível de locais (Sebbenn et al., 2000).
Segundo esses autores, as estimativas dos parâmetros genéticos dos caracteres estudados indicaram que a estratégia de conservação ex situ foi eficiente e revelaram o material também como potencial para a seleção. Os ganhos estimados pela seleção entre e dentro de progênies foram relativamente altos para alguns caracteres e populações, chegando a atingir o patamar de 14%.
Crescimento e Produção
O crescimento do jequitibá-rosa varia de moderado a rápido (Tabela 62). Em alguns plantios, o crescimento superou 21 m3.ha-1.ano-1. Em Linhares, ES, essa espécie apresentou mortalidade alta, não havendo explicação para o fato. Presume-se que os tratos culturais não tenham sido os mais adequados para a espécie (Jesus et al., 1992).
Em quatro locais no Sul do Brasil, a sobrevivência foi abaixo de 50%; possivelmente, as mortes foram ocasionadas pelas geadas.
Características da Madeira
Massa específica aparente: a madeira do jequitibá-rosa é moderadamente densa (0,50 a 0,65 g.cm-3), a 15% de umidade (Pereira & Mainieri, 1957; Mainieri & Chimelo, 1989).
Cor: alburno pouco diferenciado do cerne, geralmente bege-claro. Cerne geralmente róseo-acastanhado ou bege-rosado, ou ainda bege-rosado-escuro, eventualmente com sombras pardacentas.
Características gerais: superfície irregularmente lustrosa e ligeiramente áspera ao tato; textura média e uniforme; grã direita. Cheiro e gosto imperceptíveis.
Durabilidade natural: baixa resistência ao ataque de organismos xilófagos, quando exposta em condições adversas.
Preservação: baixa a moderada permeabilidade às soluções preservantes, quando submetida a impregnação sob pressão.
Outras Características
• O fuste do jequitibá-rosa apresenta 76% de madeira e 24% de casca.
• A madeira tem aplicação semelhante à do cedro (Cedrela fissilis), sendo um pouco inferior.
• No inicio da década de 90, a madeira serrada de jequitibá-rosa valia, no mercado de Vitória, ES, cerca de US$ 750 o metro cúbico (Jesus et al., 1992).
Produtos e Utilizações
Madeira serrada e roliça: a madeira de jequitibá-rosa pode ser usada em contraplacados, folhas faqueadas, compensados, laminados, móveis e armação, acabamentos internos, carpintaria, marcenaria, obras de interior, construção civil, em esquadrias, forro, tabuados em geral; fósforos, artigos escolares, caixotaria, saltos para sapatos, tonéis, tamancos, brinquedos, lápis e cabos de vassoura.
Energia: produz lenha de má qualidade.
Celulose e papel: essa espécie produz celulose para papel de boa qualidade, com um teor de celulose de 58,7% e teor de lignina de 24,2% (Biella, 1978). As fibras da pasta celulósica apresentaram um comprimento médio de 1,35 mm e largura média de 0,020 mm.
Resina: da casca, extrai-se resina.
Substâncias tanantes: da casca extrai-se tanino.
Apícola: as flores do jequitibá-rosa são melíferas.
Artesanato: o fruto vazio dessa espécie é usado na Região Sudeste como cachimbo rústico (“pito”).
Medicinal: a casca do jequitibá-rosa é um poderoso adstringente e tem grande poder desinfetante, sendo por isso usada na medicina popular, contra as afecções da boca, inflamação da garganta e das mucosas, amigdalites, anginas e faringites, fazendo-se gargarejos com o chá quente. A casca é usada também em lavagens vaginais, nos casos de flores-brancas, metrites e outras doenças do útero e dos ovários (Correa, 1969).
Paisagístico: espécie recomendada para arborização de praças públicas (Toledo Filho & Parente, 1988; Lorenzi, 1992).
Reflorestamento para recuperação ambiental: os frutos e as sementes servem de alimento para muitos animais. Os macacos-pregos (Cebus apella nigritus) são os principais responsáveis pela liberação das sementes.
Na restauração de mata ciliar, a espécie é indicada para locais livres de inundação.
Espécies Afins
Cariniana legalis é espécie afim de Cariniana estrellensis (ver Jequitibá-Branco), da qual se separa por apresentar frutos e folhas menores.