Credibilidade e transparência no mercado de Créditos de Carbono

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O mercado de créditos de carbono é uma ferramenta importante nos esforços para mitigação das mudanças climáticas. Ele permite que empresas e governos compensem suas emissões de gases de efeito estufa (GEE) financiando projetos que reduzem ou sequestram carbono. Contudo, para que esse mercado funcione de forma eficaz e confiável, é crucial garantir que as reduções de emissões reivindicadas sejam genuínas e verificáveis. A verificação dessas reduções é geralmente feita por terceiros independentes, que auditam e analisam dados para garantir a integridade do processo.

O Papel dos Verificadores Independentes

Os verificadores independentes desempenham um papel fundamental na validação das reduções de emissões. Esses profissionais ou empresas especializadas realizam auditorias detalhadas dos projetos, analisando dados de emissões, práticas de gestão e outras informações relevantes. Eles seguem metodologias rigorosas estabelecidas pelos programas de certificação para garantir que as reduções de emissões sejam reais e adicionais.

Isabela Morbach, advogada e cofundadora da CCS Brasil, destaca a importância da integridade dos programas de certificação para garantir que as transações de créditos de carbono realmente levem a uma redução efetiva de emissões, em vez de simplesmente transferi-las . A certificação funciona como um atestado de qualidade, semelhante ao que o Inmetro faz, assim, o mercado só se sustenta se as certificadoras forem capazes de demonstrar, por meio de sua qualidade técnica e reputação, que os objetivos dos projetos estão sendo cumpridos.

Programas de Certificação

Os programas de certificação estabelecem critérios detalhados que os projetos devem atender para serem elegíveis para a geração de créditos de carbono. Esses critérios garantem que as reduções de emissões sejam reais, adicionais, mensuráveis, verificáveis e permanentes. Alguns dos programas mais reconhecidos mundialmente incluem:

    1. Verra: Responsável pelo padrão VCS (Verified Carbon Standard), que é um dos mais utilizados globalmente. Os projetos certificados pela Verra passam por uma rigorosa verificação para garantir a integridade das reduções de emissões.
    2. Gold Standard: Este programa enfatiza não apenas a redução de emissões, mas também os co-benefícios sociais e ambientais. Os projetos devem atender a padrões rigorosos de sustentabilidade.
    3. UNFCCC: A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima supervisiona o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que certifica Reduções Certificadas de Emissões (RCEs). Os projetos registrados no MDL são rigorosamente avaliados para garantir que proporcionem reduções de emissões adicionais e verificáveis.
    4. Climate Action Reserve: Um programa norte-americano que desenvolve protocolos de projeto para diferentes tipos de atividades de redução de emissões, garantindo que os créditos gerados sejam confiáveis e transparentes.

Esses programas de certificação são essenciais para manter a integridade do mercado de carbono, pois estabelecem normas que devem ser seguidas para garantir que os créditos de carbono sejam baseados em reduções de emissões reais e adicionais. A “adicionalidade” refere-se à exigência de que as reduções de emissões não teriam ocorrido sem o financiamento proveniente da venda dos créditos de carbono.

A Importância da Transparência

A transparência é outro aspecto crucial para garantir a credibilidade do mercado de carbono. Programas de certificação confiáveis exigem que os projetos divulguem informações detalhadas sobre suas operações e resultados. Isso permite que compradores, investidores e o público em geral acompanhem e verifiquem as reduções de emissões. Isabela salienta que essa transparência promove a confiança no mercado e desencoraja a prática de comprar créditos apenas como uma forma de terceirizar a responsabilidade ambiental.

Projetos que não divulgam suas informações de forma transparente correm o risco de criar “créditos fantasmas“, que não correspondem a reduções reais de emissões. Para evitar isso, é crucial que todos os dados relevantes sejam acessíveis e verificáveis por partes interessadas independentes.

Metodologias e Auditorias

Os programas de certificação utilizam metodologias científicas para medir e verificar as reduções de emissões. Essas metodologias são públicas e auditáveis, garantindo que qualquer interessado possa revisar e entender o processo pelo qual as reduções de emissões são calculadas. Por exemplo, a Verra e a Gold Standard publicam suas metodologias, permitindo que especialistas independentes revisem e avaliem sua validade.

Além disso, os projetos passam por auditorias regulares realizadas por entidades de verificação independentes. Essas auditorias incluem a análise de dados de emissões, visitas ao local do projeto e entrevistas com os responsáveis pela implementação do projeto. O objetivo é garantir que as reduções de emissões reportadas sejam precisas e consistentes com a realidade.

Riscos e Desafios

Apesar das robustas estruturas de verificação e certificação, o mercado de créditos de carbono ainda enfrenta alguns desafios. Um dos principais riscos é a “dupla contagem”, onde as mesmas reduções de emissões são vendidas a mais de um comprador. Para mitigar esse risco, os programas de certificação mantêm registros rigorosos e sistemas de monitoramento para garantir que cada crédito de carbono seja único e não possa ser vendido mais de uma vez.

Outro desafio é a garantia de permanência das reduções de emissões. Alguns projetos, como os de reflorestamento, podem ser vulneráveis a eventos naturais, como incêndios florestais, que podem reverter as reduções de emissões obtidas. Os programas de certificação lidam com esse risco exigindo que os projetos implementem medidas de salvaguarda e planos de contingência para lidar com possíveis reversões.

Exemplos de Projetos Bem-Sucedidos

Um exemplo de projeto bem-sucedido é o programa de reflorestamento no Brasil certificado pela Verra. Este projeto não só se comprometeu a sequestrar carbono, mas também a proporcionar benefícios sociais e ambientais às comunidades locais. A auditoria independente confirmou que as metas de redução de emissões foram alcançadas e superadas, e as informações do projeto foram publicamente divulgadas para garantir a transparência.

Outro exemplo é o projeto de energia renovável certificado pela Gold Standard na Índia, que utiliza painéis solares para substituir a geração de energia a partir de combustíveis fósseis. A redução de emissões foi verificada por auditores independentes e as informações do projeto foram disponibilizadas para escrutínio público, promovendo a confiança no impacto do projeto.

O mercado de créditos de carbono é uma ferramenta poderosa na luta contra as mudanças climáticas, mas sua eficácia depende da integridade e transparência dos processos de verificação e certificação. Verificadores independentes, programas de certificação rigorosos e a divulgação pública de informações são essenciais para garantir que as reduções de emissões sejam genuínas e adicionais.

A confiança no mercado é mantida por meio de auditorias detalhadas e metodologias científicas, que asseguram que os créditos de carbono representem reduções reais e verificáveis de emissões.

A adoção de tecnologias emergentes, como o blockchain, pode melhorar ainda mais a transparência e a rastreabilidade no mercado de carbono, mas é fundamental que qualquer sistema de registro utilizado seja reconhecido e auditável por entidades independentes. Somente através desses esforços combinados podemos garantir que o mercado de carbono continue a ser uma ferramenta eficaz para a mitigação das mudanças climáticas e a promoção de um desenvolvimento sustentável.