Com o mercado florestal aquecido, a necessidade de expandir a área plantada em curto espaço de tempo exige que as empresas e prestadoras de serviço (exemplo viveiros de terceiros) atendam à demanda da silvicultura rapidamente. Nesse contexto, avaliar a qualidade da muda florestal, certamente é um desafio.
A recente inquietação nas mídias especializadas em silvicultura sobre a escassez de mudas nos viveiros florestais reflete uma mudança de paradigma. Até recentemente, esses viveiros enfrentavam desafios de baixa demanda e custos de produção elevados. Atualmente, aqueles que sobreviveram a essa fase enfrentam o desafio de atender à crescente demanda por mudas, especialmente de espécies como o eucalipto.
Essa discrepância entre oferta e procura indica a necessidade de uma análise aprofundada das variáveis envolvidas, incluindo capacidade de produção, condições climáticas e disponibilidade de recursos. A compreensão desses desequilíbrios é essencial para desenvolver estratégias que promovam a sustentabilidade e resiliência do setor florestal.
Após uma investigação mais detalhada do tema, mediante o benchmarking realizado pelo Programa Cooperativo sobre Silvicultura e Manejo – PTSM/IPEF, tornou-se claro que a denominada “escassez de mudas no mercado” não está primariamente associada à insuficiência quantitativa de mudas. O desafio preponderante para as empresas florestais atualmente reside na capacidade de suprir sua demanda por mudas com padrões de qualidade adequados para o plantio.
Na literatura especializada, encontramos diversos estudos que delinearam parâmetros para avaliação e categorização de mudas de eucalipto, pínus e espécies nativas, considerando variáveis como métodos de produção, incluindo tipos de substrato, tamanho de recipiente, lâmina de irrigação, entre outros.
Desde a publicação do livro “Produção e Controle de Qualidade de Mudas Florestais“, elaborado pelo Prof. Dr. José Geraldo de Araújo Carneiro, os parâmetros para avaliação da qualidade de mudas mantêm uma notável consistência ao longo do tempo. Entre esses critérios destacam-se: diâmetro mínimo do colo, faixa de altura ideal, número de pares de folhas, coloração das folhas, lignificação do caule, presença de raízes novas/ativas, retidão do fuste, e a aderência do substrato ao sistema radicular.
Embora haja variações atribuídas à espécie, clone e método de propagação/produção das mudas, é possível afirmar que uma muda de eucalipto de alta qualidade apresenta características morfológicas específicas. Estas incluem um diâmetro de colo situado entre 2 e 4 mm, altura variando de 25 a 35 cm, de 4 a 6 pares de folhas, ausência de bifurcação, caule retilíneo e posicionamento a 90º em relação ao plano transversal do tubete.
Um atributo ressaltado pela maioria dos viveiristas na avaliação da qualidade de mudas é a presença de raízes ativas, identificadas pela coloração esbranquiçada ao retirar as mudas do tubete. Essas raízes asseguram uma rápida expansão do sistema radicular após o plantio, propiciando condições ideais para a muda explorar um maior volume de solo, resultando em acesso a uma quantidade ampliada de água e nutrientes para sua absorção.
A maioria das empresas no segmento florestal mantém critérios de classificação de mudas bem definidos, apresentando diversos agrupamentos alinhados com a operacionalidade e cultura empresarial. Por exemplo, algumas empresas classificam as mudas em categorias como A (ideal), B (intermediária), C (imatura) e D (velhas ou passadas), utilizando uma série de critérios preestabelecidos.
Ume pesquisa recente onde fora avaliada a taxa de sobrevivência e o crescimento de eucaliptos em relação à qualidade das mudas, identificou uma gama de resultados significativos que podem ter implicações substanciais no cenário do negócio florestal, tais como:
1) o descarte de mudas fora do padrão de qualidade adequado (ex. mudas tipo C) poderia chegar a 16% da produção total, ou seja, em um viveiro com produção anual de 12 milhões de mudas, seria descartado 1,9 milhão de muda ano-1;
2) a taxa de sobrevivência de mudas tipo C ou D, após seu plantio, foi de, no máximo, 92%, o que acabou exigindo a prática de replantio (considerando mortalidade máxima de 5%) e, com isso, elevou o custo de produção em aproximadamente 6%; e
3) após 5 anos de cultivo, observou-se uma perda de produtividade de 9% no volume final de madeira em plantações onde foram utilizadas mudas “passadas” (tipo D).
É relevante salientar a escassez de estudos sobre a qualidade de mudas florestais e seu impacto nas plantações, especialmente em relação à produtividade (m3 ha-1 ano-1) ao término da rotação. Que outras pesquisas prossigam nas avaliações de longo prazo.
Reconhecendo a importância e mérito dos trabalhos científicos até o presente sobre a qualidade de mudas florestais, surge a indagação: quem é o cliente final ou preponderante do viveiro? Em minha perspectiva, a silvicultura ou a equipe de plantio desempenham esse papel.
Nesse contexto, o que as equipes de plantio e os supervisores consideram como uma muda de boa qualidade?
Arrisco afirmar que eles almejam uma muda robusta, com caule resistente, capaz de enfrentar condições adversas no campo. Buscam uma muda com substrato firmemente aderido ao sistema radicular, evitando desintegração ao desenraizar e no plantio. Preferem um caule retilíneo e com poucos ramos, minimizando emaranhados durante o plantio. Desejam uma muda que demande poucas irrigações pós-plantio até seu estabelecimento, reduzindo operações florestais.
Um atributo desafiador de avaliação na qualidade de mudas, com potenciais reflexos prejudiciais para a silvicultura, é a fitossanidade no momento da expedição. A situação torna-se mais crítica quando a empresa florestal não é autossuficiente em mudas, dependendo de viveiros terceirizados, onde o controle de patógenos pode ser secundário. Isso ressalta a importância crítica do gerenciamento fitossanitário para assegurar a integridade das mudas no momento da distribuição.
Um exemplo evidente é a disseminação da Ralstonia em praticamente todo o Brasil. Embora os danos causados por esse patógeno ainda não estejam totalmente esclarecidos, há uma inquietação expressiva no setor a respeito desse fenômeno. Essa preocupação destaca a necessidade urgente de abordagens estratégicas e medidas eficazes para lidar com potenciais ameaças fitossanitárias no contexto florestal.
Em um futuro breve, os viveiristas e as empresas florestais terão que reavaliar uma série de processos utilizados na produção de mudas, bem como os conceitos de qualidade para seu plantio no campo. E o porquê disso? Com o advento da mecanização, a silvicultura já tem à sua disposição algumas máquinas dedicadas ao plantio e algumas outras em fase de teste no Brasil.
Existem plantadoras equipadas com cabeçotes simples e triplos, atualmente em operação em diversas empresas florestais. Paralelamente, outras plantadoras estão em fase de testes e ajustes para sua adaptação e implementação em diversas condições de cultivo no Brasil, apresentando promissoras perspectivas de aprovação. Essa diversidade de equipamentos destaca a constante busca por inovações e otimizações no setor florestal.
Nas diversas demonstrações e apresentações acerca do desempenho e qualidade operacional das plantadoras florestais, tornou-se notório um ponto crucial: o padrão de qualidade das mudas deve aderir estritamente a critérios específicos. Isso é essencial para garantir um rendimento operacional satisfatório, justificando efetivamente o custo/benefício associado ao processo de mecanização do plantio. A conformidade rigorosa com tais critérios revela-se fundamental para otimizar a eficiência dessas máquinas.
Quaisquer dos “desaforos” que a silvicultura tradicional aceitava no que tange à falta de qualidade das mudas no momento do plantio não serão mais aceitos pela silvicultura mecanizada.
Isso exigirá previsibilidade, planejamento e controle rígido da qualidade operacional nos viveiros florestais e, prioritariamente, da qualidade das mudas almejada por um cliente mais exigente, ou seja, pela silvicultura moderna.